Que decepção, professor

03 de Agosto 2023 - 08h10
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Quem foi meu aluno sabe que eu nunca fiz militância política ou proselitismo político-partidário em sala de aula e trato as disciplinas que leciono com seriedade, pondo-as a serviço do conhecimento.

Não nego fatos, mesmo que eles confrontem aquilo que eu defendo. Procuro apresentá-los com isenção, amparado em bibliografia reconhecidamente legítima.

Fui, até o início deste século, simpatizante de um partido político, mas nunca defendi as propostas da agremiação partidária em sala de aula. Até porque sempre fui um eleitor ressabiado, desconfiado das agendas e principalmente das verdades partidárias.

Quem se decepciona com minhas posições políticas hoje não deve ter prestado atenção ao que eu ensinava.

Mantenho, desde sempre, a defesa dos seguintes valores: liberdade individual (de pensamento, de expressão, religiosa, sexual...) e igualdade (jurídica, de oportunidades...).

De uns tempos para cá, crítico mordaz do partido no qual votei por mais de duas décadas, não o ataco em sala de aula. Os meus posicionamentos políticos são expostos fora de sala de aula.

É pela cartilha do sociólogo alemão Max Weber que “rezo”. Nela está escrito que a tarefa crucial do professor é despertar, alargar e moldar a percepção mental dos estudantes, inculcando neles os conhecimentos necessários. O pensador alemão, é bom ressaltar, escreve pensando nos estudantes universitários, mas é possível adequar o caminho para refletir sobre o papel que o professor deve desempenhar no ensino básico, especialmente no nível médio.

Não está incluída entre as funções do professor a difusão de uma concepção pessoal de mundo dele, por isso é necessário, como ele mesmo registra n’O sentido da neutralidade axiológica” nas ciências sociais, “evitar a identificação das decisões eminentemente pessoais que um homem deve tomar por si próprio, com o ensino especializado.”

Isso não quer dizer que o professor não possa manifestar suas posições em sala de aula, mas ao fazê-lo deve seguir a seguinte trilha: 1) deixar evidente quais são os padrões de valor que guiam suas manifestações, para que estas não sejam misturadas, de forma imprecisa, com considerações empíricas e avaliações práticas e 2) não apresentar, sob hipótese alguma, as suas posições pessoais como se fossem científicas, porquanto uma tomada de posição não ter o mesmo status epistemológico do conhecimento científico.

Há quem se privilegie, nos dias de hoje, do espaço que tem em sala de aula (não sei se muitos ou poucos) para preencher um vácuo que o próprio Weber, falecido em 1920, chegou a perceber em sua época (ver Ciência como vocação), o de que muitos jovens buscam nas aulas não só análises e formulações próprias à cátedra, mas “algo diferente daquilo que está à sua frente”, a saber, buscam “por um líder, e não um professor.” Por isso, de forma dramática, apelou: “Amigos estudantes! Vinde às nossas aulas e exigi de nós as qualidades de liderança, sem compreender que de cem professores pelo menos 99 não pretendem ser treinadores de futebol nos problemas vitais da vida, ou mesmo ser líderes em questões de conduta”.

Pouquíssimos chegam próximos ao gênio alemão. Poucos chegam a compreendê-lo. Muitos precisariam pelo menos conhecê-lo para desempenhar de forma qualificada, equilibrada e honesta o nobre ofício de lecionar.