'Menino de Mossoró' fugiu com a vizinha, passou fome e percorreu 2 mil km de carona pra ver a Xuxa; confira a história

30 de julho 2023 - 06h58
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No último domingo (23), o Domingão com Huck mostrou o reencontro de Xuxa com um fã 32 anos após ele fugir de casa em Mossoró (RN) somente para vê-la no Rio de Janeiro. Hoje com 43 anos, Carlos André Gomes conta a Splash como surgiu a ideia de ver sua ídola em uma longa viagem exposta a perigos e situações difíceis, além da companhia de três amigas vizinhas.

Como tudo aconteceu

  • "Era eu e mais três amigas, minhas vizinhas. Uma delas falou 'vamos para o Rio de Janeiro ver a Xuxa?'. E eu era muito fã, nós víamos o programa, eu perdia até aula. Nem imaginava [que a gente ia], achava que era zoada", conta ele ao dizer que topou a ideia.
  • Nascido em Fortaleza, Carlos cresceu durante boa parte da infância humilde em Mossoró, onde conheceu as amigas. Na época, ele tinha 11 anos quando fugiu de casa ao lado das amigas, que também eram irmãs: Erilene Lopes, que tinha 11; Vera, de 13 anos; e Rita, a mais velha, com 21 anos. Foi Vera quem teve a ideia de ir ao Rio. Hoje, ela não gosta de falar muito sobre a "aventura".
  • "A gente tinha o sonho de conhecer a Xuxa. Lembro que a gente não tinha TV em casa e íamos assistir na porta das pessoas, que às vezes fechavam na nossa cara e a gente ia embora triste. Foi muita coisa e humilhação que passamos antes mesmo de viajar. Não pensamos em mais nada. Só queria chegar lá. Nós achamos que era só chegar no Rio de Janeiro e ir ao programa", relata Erilene, hoje com 44 anos.
  • Sem dinheiro, eles pediam comida e carona para os desconhecidos que encontravam. Foram dias de estrada para percorrer os 2.438 quilômetros de distância entre Mossoró e a capital fluminense.

Exposição a perigos

  • Carlos conta que foi uma jornada difícil para conhecer a Xuxa: "Chato demais. Foi difícil demais. Sofrendo muito mesmo. E eu pensava que não ia chegar mais. Nós passamos fome, frio. Eu não sabia nem que era frio. No sul da Bahia já sentia esse frio. Passei muita fome, andamos muito a pé também, quando não pegava carona".
  • Com medo de serem separados, eles só pegavam carona se fossem os quatro juntos e podia ser de carroça, burro ou caminhão. "Todo mundo achava que a gente era irmãos", lembra Carlos, que hoje trabalha como motorista.
  • Muitos caminhoneiros dividiam a comida com eles, que também não tinham vergonha de pedir em casas ou restaurantes. "A gente pedia o povo nas casas. Se estivéssemos no restaurante, a gente conversava com quem era encarregado, [pedia] sobra de comida", recorda Carlos André.
  • Reconhecendo os perigos de viajar só, Erilene diz que não houve abusos: "A gente passou muita coisa na estrada, principalmente medo. Para menina era mais arriscado. Mas graças a Deus minha mãe é de muita fé e ela orava para Deus nos proteger, e creio que as orações dela fizeram efeito. Não tivemos nenhum tipo de abuso, a gente tinha muito medo. Quando era alguém que oferecia, a gente não aceitava, era um combinado nosso".

A chegada ao Rio

  • Para não serem pegos em fuga, eles diziam que estavam indo para a casa dos pais, separados, que ficava na cidade vizinha a cidade em que chegavam com as caronas.
  • "A gente não falava que era de Mossoró. [Para chegar] Em Salvador, na Bahia, a gente dizia que nosso pai era de Petrolina (PE) e nossa mãe de Salvador. Não falávamos que íamos para o Rio de Janeiro porque o povo assustava", confessa Carlos.
  • Quando embarcou na aventura, Rita era a única maior de idade e havia deixado sua filha para trás para ir ver a Xuxa. Sua irmã Erilene conta que quando eles chegaram em Três Rios (RJ), ela quis voltar e conseguiu passagens com ajuda. A saga para ver a Rainha dos Baixinhos continuou somente com os menores de idade, que não quiseram desistir estando tão perto da capital fluminense.
  • Ajuda de um casal carioca "bem de vida". Já na capital fluminense, eles foram ajudados por um casal que já queriam até matricular as crianças em uma escola, mas eles não ficaram lá por muito tempo: "Era uma escola muito boa, eles eram muito bem de vida. Mas eu falei com as meninas: 'Se a gente ficar aqui, não vamos conhecer a Xuxa não, vamos fazer o que?'. E fomos para a rua, embora", conta Carlos.
  • Após dias dormindo na rua, se abrigando até mesmo próximo a delegacias, chegou o dia em que eles foram abordados quando estavam na praia. Uma perua, que teria pessoas da Assistência Social, fez perguntas para eles, que confessaram a fuga de Mossoró.
  • Carlos e Erilene dizem que eles foram encaminhados para a Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor), onde descobriram que seus pais já haviam acionado a polícia e eles voltariam para o Rio Grande do Norte.

Por que só Carlos viu a Xuxa?

  • Os três foram separados para o que seriam unidades diferentes da Febem. Por serem mais novos, eles não lembram exatamente para quais instituições haviam sido levados nem lembram o tempo total que ficaram longe dos pais. Com a divisão, as meninas não viram a apresentadora.
  • "Me senti frustrada [na época] porque o que a gente mais desejava, não conseguiu. Porque fomos parar em lugar de menor infrator, coisa que não éramos. Passamos por muita coisa, fome, frio, muito medo. Ficamos tristes porque tivemos que voltar sem conseguir ir no programa", desabafa Erilene.
  • Traumas. "A gente fica meio traumatizado por tudo que passou. Caso um dia eu encontrasse ela, não sei qual seria minha reação. Eu só queria dar um abraço nela e realizar o sonho de infância quando tentei. Só de dar um abraço já era tudo", complementa Erilene, que hoje mora em Ribeirão Preto (SP) e diz que toparia ver Xuxa, mas não faria o que um dia fez quando adolescente.
  • O sonho realizado por Carlos só ocorreu porque ele foi "atrevido", como o próprio conta:

"Falei para a diretora [da instituição de acolhimento]: 'Se você me mandar embora lá para Mossoró, eu vou voltar porque eu não vim a toa não, eu vim para conhecer a Xuxa'. Com uma semana ela diz 'vamos passear ali', e não me falou que era para o Programa da Xuxa. Chegando lá ela disse que eu ia conhecer a Xuxa, mas as meninas não poderiam conhecer porque estavam longe. E eu conheci. Isso só aconteceu porque eu fui atrevido e falei pra ela que voltaria de novo de carona se não me levassem [até Xuxa]" - Carlos André Gomes, fã de Xuxa

  • Trecho do programa de 1991 viralizado na internet. No começo de junho, após especial exibido no canal Viva, o momento em que a apresentadora recebe Carlos no palco e pede para os responsáveis falarem com a produção viralizou no Twitter.
  • Ela pergunta se valeu a pena pegar carona, e Carlos responde que não. "É difícil, né, Carlos? Tá com um olhar triste. Fica aí um pouquinho com a gente, as pessoas vão entrar em contato e você vai voltar logo [para casa]", diz Xuxa, desejando feliz dia da criança para ele e apelando para as crianças não saírem de suas cidades sozinhas somente para vê-la.
  • Após o programa, ele voltou de avião para o Rio Grande do Norte junto com as amigas e na companhia de uma autoridade. Foram recebidos pela imprensa, mesmo que eles não tenham registros da época. Carlos, por ter aparecido na televisão, ficou um bom tempo recebendo convites para almoços e jantares em Mossoró, todos para que ele pudesse contar como conheceu a apresentadora.

Reencontro 32 anos depois

  • Com o vídeo viralizado e ajuda de um fã-clube da apresentadora, a produção do programa de Luciano Huck entrou em contato com Carlos, que não acreditou até ter certeza que era alguém da Globo falando com ele por videochamada.
  • No final de junho ele viajou de Goiânia, onde mora com sua família, para o Rio de Janeiro, onde fez participação com a surpresa de Luciano para Xuxa, promovendo o reencontro de ambos após 32 anos. Desde que apareceu na TV, ele viu seus seguidores dispararem dos 9 mil para os 65 mil.
  • "Eu me senti uma criança ali. Ela tava com as duas mãos no meu rosto. Mesmo depois que terminou de gravar, ela conversou comigo olhando meus olhos. Me senti maravilhoso. Nossa, eu não esqueci daquele tempo que ela passava a mão no meu cabelo e o beijo que ela me deu no meu rosto. E agora que eu não vou esquecer mais nunca", garante Carlos.

Com informações do Splash - UOL