
O balcão de atendimento é tudo que os olhos dos clientes das redes de fast food alcançam. Atrás das telas exibindo fotos de combos, brinquedos e sorvetes coloridos fica o setor de montagem dos lanches, de preparação das carnes, a geladeira e freezer, com seus 18 graus negativos. Era nesse ambiente polar que o ex-funcionário do Burger King Paulo Ricardo Almeida de Jesus, 20, reclamou ter sido levado como forma de punição.
A informação é parte do relato de assédio moral que rendeu, em julho, ganho de causa num processo trabalhista. Também foram anexadas à ação situações como receber lanche sem carne no horário de jantar e xingamentos na frente dos colegas. Paulo Ricardo se revolta com a motivação do que classifica como perseguição: diferenças futebolísticas.
Ele é são-paulino no nível de usar capa do celular do clube e estar em vários grupos de WhatsApp sobre o time. O gerente que supostamente executava as punições pertence à Pavilhão Nove, torcida organizada do Corinthians. O que reforça a crença de Paulo Ricardo sobre a razão ser o futebol é que o mesmo comportamento era dirigido a outros dois colegas tricolores.
Paulo Ricardo entrou no Burger King da avenida Roberto Marinho, em São Paulo, no dia 21 de junho de 2018. Ele disse que o ambiente de trabalho foi amistoso até o começo do ano seguinte, quando houve troca de gerente. O primeiro golpe na harmonia do restaurante seriam os xingamentos em tom de voz alterado. "Que p.. é essa? Que m... você tá fazendo aqui?", era a forma de o chefe se dirigir aos funcionários, de acordo com Paulo Ricardo.
Até então ele tinha recebido duas promoções e era instrutor. Nada que impedisse de ser transferido para o turno da madrugada junto com os outros dois são-paulinos da equipe. Os três tinham que tocar o restaurante e o gerente ficava na supervisão.
De acordo com o instrutor, em certa ocasião a carne queimou e ele foi chamado para dentro do freezer. Recebeu uma reprimenda e um murro no corpo. Precisou ficar cinco minutos no ambiente gelado antes de sair. Na época, Paulo Ricardo tinha 17 anos e ficou consternado. Apesar da raiva, o sentimento que prevaleceu foi uma confusão que levou à paralisia.
Hoje, ele avalia que a juventude, aliada à necessidade do emprego, fizeram com que não reagisse. O instrutor mora com o pai no Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, e sua parte nas contas de casa são a água e a energia elétrica. "Se reagisse, ele ia dar suspensão e advertência e eu ficava com medo."
Paulo Ricardo afirma que o gerente era mais velho, mas menor em altura e porte físico. Ainda assim, nunca pensou em revidar. O instrutor disse que, se fosse obrigado a entrar no freezer com a idade atual, o desfecho da história seria diferente. "Não ia aceitar isso de nenhuma forma."
Com informações do Tab/UOL