Auxílio-moradia e bônus extinto rendem salários de até R$ 1,5 mi a juízes

25 de Junho 2023 - 03h49
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Levantamento do UOL nas folhas de pagamento dos 92 tribunais do Judiciário mostra que os chamados "penduricalhos" —remunerações extras como pagamentos retroativos de adicionais por tempo de serviço e de auxílios-moradia— renderam salários mensais de até R$ 1,5 milhão a magistrados no ano passado.

Do que são feitos os 'supersalários'

O UOL identificou nove contracheques de salário mensal superiores a R$ 1 milhão, em valores brutos, pagos a juízes e desembargadores em dezembro e janeiro de 2022. São as maiores remunerações pagas a magistrados nos últimos três anos. Desde 2020, mais de 30 mil salários superaram R$ 100 mil —eles são 3% do total de holerites, mas equivalem a mais de 10% dos pagamentos feitos pelos tribunais (R$ 4,7 bilhões).

 

Os salários milionários foram pagos a juízes e desembargadores —atualmente aposentados— do TJ-RO (Tribunal de Justiça de Rondônia), da Justiça Federal do Ceará e de Pernambuco e do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), em Porto Alegre (RS).

TJ-RO no topo do ranking. Seis dos maiores salários chegaram à casa do milhão devido ao pagamento de auxílio-moradia retroativo aos anos de 1987 a 1993 na Justiça de Rondônia —isto é, há mais de 30 anos. Os valores foram pagos entre 2016 e 2022.

Benefício vetado. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) proibiu em 2018 que os tribunais pagassem auxílio-moradia retroativo. O TJ-RO alega, contudo, que os pagamentos foram definidos por acordos judiciais anteriores a essa decisão.

Bônus extinto. Os outros três contracheques milionários foram turbinados por adicionais por tempo de serviço, como o quinquênio. O bônus retroativo —extinto pela reforma previdenciária de 2003— foi pago, contudo, a esses magistrados antes de abril, quando o CNJ e o TCU (Tribunal de Contas da União) suspenderam os repasses na Justiça Federal.

O quinquênio —benefício somado aos salários de magistrados periodicamente— deixou de ser pago em 2006, mas juízes de diferentes tribunais do país vêm embolsando valores retroativos com base na interpretação de uma decisão do STF.

UOL fez a análise a partir de salários brutos publicados no Painel de Remunerações de Magistrados, do CNJ, entre janeiro de 2020 e abril deste ano. Para isso, descontou indenizações, diárias e o chamado abate-teto (desconto feito no contracheque para não superar o teto constitucional do Judiciário, de R$ 41.650,92).

Por que esses salários extrapolam o teto. Os contracheques milionários são até 35 vezes maiores que o teto constitucional, que é baseado nas remunerações dos ministros do STF. O auxílio-moradia não é descontado no abate-teto —valores subtraídos do contracheque para manter o salário no limite estabelecido por lei—, e tribunais entendem que pagamentos retroativos também podem extrapolar o limite.

Procurados, os tribunais dizem que as verbas retroativas que inflaram os contracheques milionários são legais.

'Eu não jogo dinheiro fora, não'

O desembargador aposentado Gabriel Carvalho, dono do terceiro maior contracheque desde 2020 (R$1,18 milhão, em valores brutos), define como "justo" o pagamento do auxílio-moradia retroativo.

Ajuda bem, é claro. Não vinha dependendo disso porque a gente se acostuma a viver com o pouco. Já gastei [risos]. Foi bem-vindo. Eu quitei uma coisinha. Comprei um imovelzinho aqui, tá certo? Reformei um apartamentinho. Eu não jogo dinheiro fora, não.
Gabriel Carvalho, desembargador aposentado do TJ-RO

Fonte: Uol