A viagem com o tricampeão

10 de Outubro 2021 - 05h25
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O ano era o de 1993. Era um domingo. Naquele dia, eu estava indo a São Paulo nas asas da já cambaleante e hoje saudosa Viação Aérea São Paulo – VASP. Na escala em Brasília, adentrou a aeronave um senhor que sentou ao meu lado na fileira de poltronas. Puxou conversa, perguntou de onde eu estava vindo e ao me referir a Natal disse-me que tinha sido muito amigo do homem que dava o nome ao estádio de futebol de Natal.

Naquele mesmo dia, o Brasil enfrentaria a Bolívia pelas eliminatórias da Copa/94. A seleção brasileira não estava bem e a Bolívia, assim como a Colômbia, eram os destaques daquele torneio.

A conversa enveredou para o futebol e falei da descrença do povo brasileiro com sua seleção e o medo de ficarmos de fora de uma Copa do Mundo. O senhor então, firme e taxativo, disse-me:

- Nós nunca deixaremos de participar de uma Copa do Mundo.

Eu retruquei e perguntei qual a garantia que ele tinha para me certificar o que dizia, no que ele respondeu, seco:

- A garantia de quem é tricampeão mundial.

Naquele momento fui apresentado ao Dr Mário Trigo, dentista da seleção brasileira nas Copas de 1958, 1962, 1966 e 1970 e que incutiu na cabeça dos dirigentes e dos jogadores que uma boa saúde bucal podia ser responsável por menos lesões musculares.

O trecho entre Brasília e São Paulo ficou muito curto para minha experiência ao lado daquele senhor simpático e grande contador de histórias, entre elas uma com Garrinha.

Na preleção antes da partida contra os soviéticos em 1958, quando foi decidido alterar a equipe titular com as entradas de Zito, Garrincha e Pelé nos lugares de Dino Sani, Joel e Mazolla, respectivamente, Vicente Feola dirigiu-se ao ponta-direita e, em tom sério, determinou a ele:

- Mané, você vai começar o jogo bem aberto na direita. O Didi vai lhe passar a bola e você vai descadeirar os beques russos, driblá-los todos e quando estiver cara a cara com Yashin, chute forte para fazer o gol porque ele é o melhor goleiro do mundo. Alguma dúvida????

E Garrincha, inocente, respondeu.

- Tenho uma dúvida, Seu Feola. O senhor já combinou tudo isso com os russos????

A verdade é que aos 40 (quarenta) segundos de jogo, Garrincha entortou diversas vezes o zagueiro Boris Kuznetsov, passou como se ele não existisse, entrou na área e chutou forte, mas a bola carimbou a trave esquerda de Yashin e foi para fora. Kusnetsov se tornou o primeiro “joão” entre muitos que se atreveram a parar Mané Garrincha.