Turista estuprada em hotel de Natal vence ação, mas não é indenizada após 4 anos

10 de Maio 2024 - 17h02
Créditos: Divulgação

 

A paulista Andreia Bianchini tinha 48 anos quando sofreu o maior trauma de sua vida: enquanto dormia em um quarto de hotel em Natal (RN), onde passava as férias, em 2018, um homem invadiu seu quarto pela varanda, amordaçou-a, amarrou seus pés e braços e violentou-a antes de fugir com seus pertences do Hotel Bello Mare, na zona sul da capital potiguar.

Seis anos depois do crime e quatro anos após a Justiça dar ganho de causa a Andreia, o hotel ainda não pagou a indenização, hoje estimada em R$ 350 mil.

Andreia tomou um susto ao acordar por volta das 2h40 e se deparar com um homem ao lado de sua cama. Ela dormia em um quarto no terceiro andar do hotel quando despertou no meio da madrugada com o barulho de sacolas sendo reviradas. Ao se virar para ver o que era, um homem de aproximadamente 1,85m, aparentando 30 anos de idade, já estava encostado na cama olhando para ela.

"Com uma faca na mão, ele falou baixinho para eu ficar quieta porque era um assalto", disse.
Andreia Bianchini, 54 anos

Àquela altura, ela já havia tirado da bolsa o dinheiro, celular e cartão de banco. "Com uma caixa de bijuterias na mão, ele perguntava 'cadê as joias?', mas eu não tinha joias", disse.

Nervoso, ele só parava de revirar as sacolas para vigiar a sacada. "Primeiro, ele disse que não ia fazer nada comigo, mas de repente mudou de ideia", conta.

O terror durou cerca de 40 minutos. Andreia ficou na cama até perceber que o homem não voltou depois de ir para a sacada pela última vez. "Então tirei a mordaça empurrando com o ombro. O pé, eu fui esfregando até soltar. Como não consegui soltar as mãos, peguei o cartão do quarto com a boca e passei na porta para abrir", recorda.

"No impulso", saiu correndo até a recepção. "Quando cheguei, tinha um funcionário perto da máquina de refrigerante e outro olhando o celular no sofá, enquanto no balcão, onde os computadores mostram as imagens das câmeras de segurança, não tinha ninguém", afirma.

Ela diz que, nessa mesma hora, o criminoso pulou o muro e passou caminhando em frente ao hotel. Um funcionário e um taxista ali perto chegaram a correr atrás do homem, que entrou em uma viela.

A suspeita é que o homem tenha tido acesso fácil à varanda. "Como a rua é uma subida, cada passo que você dá fica mais perto da sacada", diz Andreia. No processo, o hotel diz que "o meliante escalou pelo prédio vizinho".

Andreia tem culpa, diz hotel
O hotel argumenta na ação que o crime foi uma "fatalidade em face ao aumento da violência da cidade". "O meliante ingressou no apartamento pela varanda, que se encontrava aberta. Ou seja, não houve negligência por parte do hotel em relação a qualquer tipo de facilitação no evento ocorrido", afirma.

A Justiça discordou em sentença de 21 de maio de 2020. "Se o hotel dispõe aos seus clientes apartamento com varanda (...), não pode esperar que os clientes permaneçam com ela fechada, ainda mais em se tratando de hotel próximo ao mar", diz a decisão. "Quando da venda dos serviços e chegada da turista ao hotel, não houve qualquer menção ou advertência de que as janelas deveriam permanecer fechadas."

Na época, a Justiça em segunda instância mandou o hotel pagar uma indenização por danos morais e materiais. "Mas esse valor nunca foi pago", diz Fernanda Salvador, advogada de Andreia. "O hotel não pode mais recorrer."

Com a correção dos juros, a cifra gira hoje em torno de R$ 350 mil. "Antes e depois da sentença, tentamos dois acordos com o hotel: primeiro disseram que pagariam R$ 100 mil e depois R$ 150 mil, mas descumpriram."

A advogada diz acreditar que o hotel esconde os bens para não indenizar Andreia. "Estamos na fase de levantar esses bens, mas parece que estão colocando em nome de terceiros", diz.

Depois da polêmica, o empreendimento Recreio Ponta Negra arrendou o hotel a outra empresa por cinco anos. "Apuramos que esse aluguel gira em torno de R$ 200 mil a R$ 300 mil por mês", afirma a defensora.

O acordo não teve "êxito em razão de não consenso de valores". "Nunca houve a formalização de acordo e muito menos inadimplência do hotel", diz o advogado do Bello Mare, Marcilio Mesquita, que diz não "tecer maiores detalhes sobre o caso" porque "o processo tramita resguardado pelo segredo de Justiça".

"Hotel não me ajudou"
Depois do crime, Andreia foi ao hospital fazer corpo de delito. "Tomei muitas injeções e comprimidos. Na delegacia, comecei a passar mal depois de fazer o boletim de ocorrência", afirma. "Ninguém do hotel foi comigo à delegacia. Quem me ajudou foi uma família de Uberlândia que conheci na viagem."

No processo, o hotel diz que se colocou "à disposição para suporte e atendimento necessários". Afirma que comprou as passagens para que parentes de Andreia viajassem de São Paulo para prestar auxílio e que "providenciou a sua hospedagem e de seus familiares em outro hotel".

O homem nunca foi preso.

Andreia paga do bolso os remédios e o tratamento psicológico e psiquiátrico. Desempregada, ela precisou antecipar a aposentadora. "Eu ia me aposentar com rendimento integral aos 57 anos, mas antecipei e agora ganho quase metade", afirma.

Com informaçoes de UOL