Pai investe 3 milhões de dólares e cria rede mundial de pesquisas para buscar cura de câncer que afeta o filho

12 de Agosto 2023 - 10h45
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Um pai recebe a notícia de que o filho de 9 anos tem um tumor cerebral e, diante de um prognóstico ruim, cria uma rede internacional em busca de fundos para o financiamento de pesquisas que busquem a cura da doença. Ele próprio faz uma doação inicial de US$ 3 milhões.

O protagonista desta história é o empresário gaúcho Fernando Goldsztein, 56, um dos sócios da construtora Cyrela. Há oito anos, o filho Frederico, hoje com 16 anos, foi diagnosticado com meduloblastoma, a forma mais comum de câncer cerebral a afetar crianças e adolescentes, presente em cerca de 20% desses casos.

“Foi a batalha mais difícil que enfrentei na vida, muito pior do que a minha própria experiência com o câncer. Crianças não deveriam ter câncer nunca”, diz. Em 2005, o empresário descobriu um condrossarcoma, um tumor ósseo, fez tratamento em Houston, no Texas (Estados Unidos), e está curado.

O filho Frederico passou por cirurgia, seguida de radioterapia e quimioterapia. Mas em 2019 teve uma recidiva da doença, o que acontece com até um terço das crianças com meduloblastoma. “Esse câncer quando volta, não tem cura, os médicos não têm nenhum plano de tratamento para recomendar, e a chance de sobrevida fica abaixo dos 5%”, relata o pai.

Em busca de terapias experimentais para o filho, o empresário conheceu pesquisadores em vários países que se dedicam a estudar esse tipo de tumor. Entre eles, o americano Roger Packer, co-presidente do Comitê de Neoplasias Malignas Cerebrais do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos (NCI) e uma das maiores autoridades em neurooncologia pediátrica no mundo.

Com a orientação de Parcker, Frederico tem participado de protocolos clínicos para o tratamento do meduloblastoma recorrente. Também teve acesso a um novo tipo de radioterapia não disponível no Brasil. Segundo o pai, o quadro clínico está estável. “Ele tem vivido a vida dele normalmente, vai à escola, é um menino muito corajoso, enfrenta tudo o que tem que enfrentar.”

Um outro aspecto dramático do meduloblastoma é que muitas crianças que se curam do tumor podem sofrer sequelas sérias do tratamento. “A radioterapia teve evolução, mas a quimioterapia continua a mesma há 30 anos. As crianças que se curam podem ter muitos efeitos colaterais, como problemas cognitivos, de crescimento e até mesmo tumores secundários.”

Foi a partir do inconformismo com as baixas taxas gerais de sobrevida nos casos de recidiva e com os efeitos tóxicos dos tratamentos que Goldsztein decidiu que faria algo a mais do que apenas buscar terapias possíveis para o filho. “Por muitos anos me questionava sobre qual era minha missão nesta vida. Há dois anos, eu encontrei.”

Criação da rede mundial de pesquisas

Em 2021, ele criou a Medulloblastoma Initiative, que articula apoio financeiro a um consórcio de 13 laboratórios com tradição na pesquisa de meduloblastoma, instalados em instituições renomadas nos Estados Unidos, Canadá e Alemanha.

Chamado Cure Group 4 Consortium, o time é formado por um grupo de pesquisadores, entre eles, alguns dos principais cientistas que investigam meduloblastoma no mundo. Roger Parcker está na liderança. “Em vez de os laboratórios competirem entre si, estão fazendo um trabalho conjunto e sinérgico para buscar a cura o mais depressa possível.”

Arrecadação ao redor do mundo

Até o momento, além dos US$ 3 milhões doados pela família Goldsztein, foram arrecadados mais de US$ 8 milhões em contribuições pelo mundo. Até o fim deste ano, a iniciativa quer alcançar a meta de US$ 15 milhões. Segundo Goldsztein, o investimento é necessário para o desenvolvimento dos testes clínicos em pacientes, que devem acontecer, inclusive, no Brasil.

Nos primeiros seis meses de atividades, o grupo fez uma descoberta inédita: a identificação do provável mecanismo de desenvolvimento da célula que dá origem ao meduloblastoma.

O artigo científico relatando a descoberta, com o reconhecimento ao apoio da Medulloblastoma Initiative, foi publicado em setembro de 2022 na revista Nature.

De acordo com Goldsztein, a previsão é que até o início de 2024 o grupo submeta ao FDA (agência americana que regula alimentos e medicamentos) os primeiros ensaios clínicos. “São dois ligados às células T [que desempenham papel central na resposta imunológica contra patógenos] e um que busca uma vacina de RNA específica para o meduloblastoma.”

Com informações da Folha de São Paulo