Museu da Dinamarca vai devolver para o Brasil relíquia sagrada Tupinambá que está na Europa desde o séc. XVII

27 de Junho 2023 - 15h47
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Um dos mais bem preservados entre os onze mantos tupinambás remanescentes do século XVII voltará definitivamente da Europa para o Brasil. Até o fim de 2023, o tesouro confeccionado com as penas vermelhas do guará deixará para trás a coleção etnográfica do Nationalmuseet, o museu nacional da Dinamarca, e integrará o acervo do Museu Nacional no Rio de Janeiro. A instituição dinamarquesa anunciou a doação nesta terça-feira. A peça, que os indígenas consideram sagrada, está em Copenhague desde 1689, segundo registros oficiais.

“É uma grande honra para nós receber um dos principais artefatos etnográficos do Brasil, que se encontra no exterior há tanto tempo. A devolução mostra a confiança do Nationalmuseet no nosso trabalho, depois de tudo o que aconteceu”, disse ontem à piauí Alexander Kellner, diretor do Museu Nacional. Na noite de 2 de setembro de 2018, um curto-circuito desencadeado pelo superaquecimento de um ar-condicionado provocou um incêndio que destruiu boa parte da instituição brasileira.

Em nota oficial, o Nationalmuseet destacou que a doação do manto é uma “contribuição única e significativa” para a recuperação do acervo brasileiro. “As heranças culturais têm um papel decisivo nas narrativas das nações sobre si mesmas. É assim no mundo inteiro. Por isso, é importante para nós ajudar a reconstruir o Museu Nacional do Brasil depois do incêndio devastador de alguns anos atrás”, afirmou na nota o antropólogo Rane Willerslev, diretor do Nationalmuseet.

O manto em questão mede 1,2 metro de altura por 60 cm de largura. Possui um gorro e uma capa, que constituem um único traje. As penas de guará se encaixam sobre uma base de fibra natural, parecida com uma rede de pesca. Os tupinambás usavam vestimentas do gênero em ocasiões formais, como as assembleias, os enterros de pessoas queridas e os rituais antropofágicos, a celebração mais imponente promovida por eles no período colonial. O museu de Copenhague não sabe informar quem trouxe a peça sagrada para a Dinamarca nem por quê.

A instituição do Rio pretende exibir o manto a partir de 6 de junho de 2024, quando o museu completará 206 anos. Na ocasião, será reaberta apenas uma pequena sala, e nela estará a relíquia. A cenografia deve ser planejada pela equipe da entidade em parceria com os indígenas. 

“O Museu Nacional e os tupinambás mantêm uma relação próxima há mais de duas décadas”, lembra João Pacheco de Oliveira, antropólogo e curador das coleções etnográficas da instituição. Ele explica que a devolução de objetos ritualísticos é complexa e implica o envolvimento de intelectuais indígenas e dos conhecedores da tradição, inclusive daqueles que sabem trabalhar com arte, sonhos e xamanismo. “Estamos preparando os profissionais do museu para receber de maneira adequada uma peça tão rara.”

Com informações de Folha de S. Paulo