Ministério da Saúde altera critérios de confirmação dos óbitos por covid-19

24 de Março 2021 - 13h18
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Nesta terça-feira (23), dia em que o Brasil bateu recorde de mortes por covid-19 confirmadas em 24 horas, o Ministério da Saúde modificou a ficha dos pacientes no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe). A informação é de técnicos responsáveis pelo preenchimento das atualizações diárias sobre novos óbitos provocados pela doença.

De acordo com eles, os dois principais impactos da mudança foram:

  • a falta de aviso prévio por parte do Ministério às secretarias – ao contrário do ocorrido em julho do ano passado, na mudança anterior da ficha;
  • e a exigência de preenchimento obrigatório de novos campos– para os técnicos, isso pode aumentar o atraso entre a ocorrência das mortes e o registro no sistema.

O Sivep-Gripe é o sistema no qual as novas hospitalizações por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) devem ser compulsoriamente notificadas desde 2009. No ano passado, com a pandemia de covid-19, ele passou a ser utilizado também como a fonte oficial das mortes confirmadas pela nova doença.

A secretaria-executiva do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) informou, nesta quarta-feira (24), que defende a exclusão dos novos campos obrigatórios. Segundo o Conasems, as mudançar já estavam sendo discutidas, mas houve "falta de comunicação adequada" quando elas foram oficialmente instituídas.

Já presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Carlos Lula, afirmou que o Ministério da Saúde precisa rever "imediatamente" a norma que modifica critérios de mortes por covid-19. Ele afirma que entidade não foi comunicada.

Confira as mudanças

A nova ficha distribuída às vigilâncias de saúde municipais e estaduais tem uma série de mudanças. Foi adicionado, por exemplo, um campo para indicar se o paciente pertence a uma comunidade tradicional. Por outro lado, alguns campos foram excluídos – como o histórico de viagem internacional.

Outras modificações, no entanto, devem afetar mais diretamente o trabalho de preencher o sistema, como a obrigatoriedade de informar:

  • o nº do Cartão Nacional de Saúde (Cartão SUS);
  • se o paciente é brasileiro ou estrangeiro;
  • e se já recebeu vacina contra a Covid-19.

Esses campos não existiam na versão anterior da ficha, que está sendo atualizada desde julho de 2020.

Instabilidade na terça

Nesta quarta (24), ao menos dois governos estaduais e um municipal relataram que queda na notificação de novas mortes por causa das mudanças no sistema.

Em São Paulo, o governo disse que "a medida pegou os municípios de surpresa, fazendo com que muitas cidades não conseguissem registrar todos os óbitos no sistema nacional oficial".

"Além disso, muitas cidades reportaram à Secretaria de Estado da Saúde instabilidade do sistema desde a tarde de ontem [terça], também dificultando a inserção de dados".

Na terça, São Paulo confirmou 1.021 óbitos, sobretudo devido ao represamento no final de semana, que é mais elevado do que em dias úteis.

Nesta quarta, no entanto, foram 281 óbitos confirmados em 24 horas, número mais baixo para este dia da semana desde 17 de fevereiro.

No Mato Grosso do Sul, o secretário de Saúde, Geraldo Resende, declarou que as 20 mortes confirmadas em 24 horas não representam a "realidade". "Nós estamos tendo muito mais óbitos que esses anunciados hoje. Mas é porque o sistema, chamado Sivep, está com oscilação, está dificultando a inserção de dados, e certamente amanhã nós vamos ter um número elástico de óbitos, já que a nossa média móvel já ultrapassou a 30 óbitos por dia", disse.

Impacto na contagem de óbitos

A ficha do Sivep-Gripe vale para todos os hospitais e vigilâncias municipais do Brasil. A ficha do paciente deve ser preenchida conforme o paciente evolui e novas informações são obtidas.

De acordo com técnicos que são usuários do Sivep, em alterações anteriores da ficha, não houve necessidade de preenchimento retroativo de novos campos para pacientes que já estavam regidtrados do sistema.

O coordenador do InfoGripe – plataforma da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que desde antes da pandemia de covid-19 já usava o Sivep-Gripe para rastrear casos de SRAG no país –, Marcelo Gomes, explica que a mudança pode levar ao atrado nas notificação de casos e de óbitos.

Ele afirma que "é uma mudança que facilita a limpeza de duplicidades e identificação de casos suspeitos de reinfecção, mas o impacto na ponta é muito grande por conta da falta de acesso fácil ao CPF e CNS de todos os pacientes internados".

Marcelo diz ainda que "diversos pacientes buscam atendimento apenas com RG, tornando a ausência de acesso ao CPF importante. Nesses casos, torna-se necessário o agente de saúde pesquisar o CNS do paciente, caso já tenha sido cadastrado ou efetuar o cadastro do CNS caso contrário".

Para Gomes, a alteração "tende a atrasar ainda mais o registro, aumenta a carga de trabalho, por ter que buscar o CNS do paciente que não apresentar CPF, e corre-se o risco de perda de registros por conta disso".

Fonte: G1