Excesso de vestais

14 de Agosto 2023 - 06h23
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A cada escândalo que pipoca no Brasil descobrimos, na política e na mídia nacionais, que temos abundância de vestais. Ou de cínicos.

O da vez é a suspeita forte, diga-se de passagem, de que Jair Bolsonaro e aliados venderam presentes recebidos de autoridades de vários países quando ele ocupava a Presidência da República.

Há fortes indícios, segundo dizem jornalistas bem-informados espalhados pelo país, de que a ex-primeira família sempre foi um desarranjo. Na política ela forma um grupo que, justamente por não ser convidado para os grandes esquemas e as grandes mamatas, em ministérios, empresas estatais e agências reguladoras, arrecada uns trocados como podem e os lavam em imóveis e lojinhas.

Político brasileiro pego com a boca na botija nunca foi surpresa. Se há algo de realmente surpreendente e extraordinário no momento é ver gente que finge nunca ter visto ou ouvido falar no trânsito de pastas, bolsas e malas de dinheiro surrupiado para financiar campanhas, em desfalques e rombos colossais em empresas públicas, em descobrir políticos poderosos na folha de pagamento de empreiteiras e autoridades judiciais participando de convescotes financiados por gente que tem interesses inconfessáveis em tribunais.

De uma hora para outra estão todos escandalizados com os malfeitos de Jair Bolsonaro.

O escândalo das joias de Bolsonaro e sua trupe, a se confirmar, é coisa de punguista batedor de carteira. Não deve ser varrido para debaixo do tapete, no entanto é preciso colocá-lo em seu devido lugar e na devida proporção. É coisa de trocados, quando comparado às grandes negociatas feitas na corrompida, aviltada e maltratada república brasileira.  

Foi essa gente afeita a bater carteira para vender joias que governou o Brasil entre 2019 e 2022. É um pessoal indigno e que deve ser punido pela falta. Mas sejamos francos, além da falta de espírito público faltou outro tipo de grandeza aos punguistas da vez. Não trouxe para a ribalta a grandiosidade do mensalão (https://memoriaglobo.globo.com/jornalismo/coberturas/mensalao/noticia/mensalao-cronologia-do-caso.ghtml) e do petrolão (https://epoca.globo.com/tempo/noticia/2014/12/petrolao-uma-baula-de-crimeb.html) e, desculpem-me o trocadilho, a grandiosidade dos anões do orçamento (http://memorialdademocracia.com.br/card/cpi-investiga-anoes-do-orcamento).

Os desvios de Bolsonaro foram da ordem que foram porque ele sempre foi – na vida pública, antes, durante e depois da Presidência da República – baixo clero.

O Brasil está testemunhando – no meio político e na grande mídia – ao nascimento, por milagre ou por cinismo, de súbita multidão de vestais dignas das mais sagradas ordens religiosas.