
A atuação de uma das principais entidades envolvidas no escândalo do INSS atingiu diretamente o Congresso Nacional com o objetivo de estender irregularidades e afrouxar os mecanismos de fiscalização. Emendas apresentadas por deputados e senadores de esquerda para mudar medida provisória (MP) que buscava coibir fraudes foram redigidas dentro de escritório de uma entidade suspeita de desviar até R$ 2 bilhões dos aposentados, revela investigação feita pela coluna Tacio Lorran, de Metrópoles. Trata-se da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), entidade historicamente ligada ao PT e que, de acordo com a Polícia Federal, realizou descontos indevidos em massa de milhares de beneficiários da Previdência Social.
As emendas da Contag foram apresentadas junto à tramitação da Medida Provisória 871/2019. Os textos têm as assinaturas de deputados e senadores. No entanto, a coluna analisou os metadados desses documentos e descobriu que a entidade aparece como a verdadeira autora das propostas. De um total de 578 emendas, 96 têm o nome da Contag ou de advogada da confederação como autor.
Os dados revelam também a capilaridade do lobby da Contag. Quinze deputados e senadores, sendo nove do PT, assinaram emendas redigidas pela entidade.
E a atuação não ficou só no papel. Um dos principais pleitos da confederação foi aprovado no Congresso: o fim da revalidação anual dos descontos associativos do INSS. A medida estava prevista na MP publicada em 2019 pelo governo Bolsonaro. A ideia era que essa revalidação periódica limpasse as fraudes para trás e coibisse também novos abusos. Na ocasião, os parlamentares conseguiram adiar essa exigência para ser feita a cada três anos. No entanto, a medida nunca foi colocada em prática, uma vez que outra MP publicada em 2022 revogou, em definitivo, qualquer tipo de revalidação de assinaturas e autorizações por parte de aposentados e pensionistas.
Os metadados funcionam como um tipo de identidade dos documentos. Na prática, permite identificar informações, como a data e o horário de criação do arquivo, eventuais modificações e o nome do autor.
Procurada, a Contag informou que “repudia qualquer tentativa de generalização que coloque organizações sérias no mesmo patamar que estruturas criadas para fraudar o sistema previdenciário”. Questionada sobre os metadados que revelam a autoria das emendas da MP 871/2019, a entidade esclareceu que apoia e colabora com propostas no Poder Legislativo há 60 anos. Já os parlamentares indicaram que atuaram em nome da bancada do PT.
Revalidação anual de descontos do INSS seria “inviável”, dizem documentos redigidos pela Contag
Algumas emendas redigidas pela Contag eram idênticas umas às outras e tinham temas comuns que se repetiam. Doze delas, por exemplo, traziam esta mudança em um artigo substancial para a Contag: passar de um para cinco anos o prazo de exigência para revalidação dos filiados aos sindicatos rurais e associações.
Na justificativa do texto, os argumentos são os mesmos. Fazer a renovação anual seria “praticamente inviável” para essas entidades.
“Inobstante ser clara a diretriz da não interferência estatal no escopo organizativo das entidades associativas sem fins lucrativos, resta conhecida a necessidade de parametrizar os descontos das mensalidades associativas via INSS, visando com isso resguardar o ente público, não sem antes mensurar a inviabilidade operacional de revalidação anual das autorizações que os associados fornecem para o desconto da mensalidade social de seus benefícios previdenciários, haja vista a movimentação diária de autorizações feitas por todas as entidades que mantém Acordo de Cooperação com o INSS”, diz trecho da emenda.
“Assim, revalidar cada autorização anualmente torna o desconto da mensalidade social praticamente inviável”, prossegue o documento. Por fim, a lei foi aprovada estabeleceu o prazo de renovação a cada três anos, algo que jamais foi cumprido.
É prerrogativa dos parlamentares, durante a tramitação de medidas provisórias e projetos de lei, apresentarem emendas para modificar a legislação. Essas sugestões visam suprimir, inserir ou dar nova redação a artigos e incisos. Cada uma dessas proposições precisam ser votadas e aceitas. Por fim, o texto é sancionado pelo presidente da República.
Com informações de Tacio Lorran, Metrópoles