
Advogados criminalistas ouvidos pelo site Poder360 afirmam que o acesso a dados do sistema sigiloso da Segurança Pública de São Paulo por Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), com o auxílio de um policial civil, pode configurar crime de violação de sigilo funcional, segundo o artigo 154 do Código Penal.
A ação de Tagliaferro se deu para atender a pedidos informais para a produção de relatórios sobre a segurança do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes e de familiares, feitos pelo policial militar Wellington Macedo, que atua no gabinete do magistrado. O caso foi revelado em reportagem da Folha de S.Paulo.
O coordenador do escritório Alves Corrêa & Veríssimo Advocacia, Oberdan Costa, afirma que “teria praticado esse crime, caso comprovadas as denúncias, o policial civil que violou o sigilo das investigações que conduz em prol do pedido de alguém estranho à investigação, bem como a pessoa que o encomendou”. O crime tem pena de detenção de 3 meses a 1 ano ou multa.
Na análise do secretário-geral da Comissão de Segurança Pública da OAB-MG (Ordem dos Advogados Seção Minas Gerais), Berlinque Cantelmo, o uso dessas informações sigilosas em um contexto de violação de função pública pode ser crime, principalmente se houver desvio de finalidade no acesso aos sistemas de segurança.
“É difícil justificar uma possível intervenção do ministro, por meio de seus assessores ou outros, em uma pesquisa, levantamento de informações ou diligências realizadas por meio dos sistemas da Segurança Pública do Estado de São Paulo. Mesmo que haja acesso a esse tipo de plataforma, o método utilizado, especialmente se baseado em uma ordem de ofício possivelmente emitida pelo ministro Alexandre de Moraes, pode ser considerado ilegal e incongruente com a finalidade adequada de utilização desses sistemas e plataformas”, diz Cantelmo.
O secretário-geral afirma ainda que, se confirmado, trata-se de uma “clara incongruência”, pois, embora a Corte Eleitoral tenha poder de polícia e possa iniciar investigações, as atividades devem estar exclusivamente voltadas para questões eleitorais.
“Pelo que sabemos, a família do ministro Alexandre de Moraes não tem qualquer vínculo com demandas de caráter eleitoral que estejam em andamento no TSE”, afirma Cantelmo.
Segundo o advogado, “resta saber se o ministro Alexandre de Moraes utilizou seu poder como presidente do Tribunal Superior Eleitoral para acessar sistemas de informações de segurança pública com o objetivo de proteger sua família ou para fins privados”.
Ricardo Jacobsen Gloeckner, especialista em direito processual penal e professor da PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), também diz que, em tese, o acesso a dados restritos “é um crime equiparado à violação de sigilo profissional”.
O advogado afirma que a questão central é determinar se “há realmente prova” e se “houve de fato o acesso”.
A Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo instaurou na quinta-feira (15) um procedimento para investigar o suposto vazamento de informações sigilosas.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Estado informou que o PM alocado no gabinete de Moraes “encontra-se regularmente afastado para exercer cargo em comissão junto ao STF”.
Leia a íntegra da nota da Polícia Civil de SP:
“A Polícia Civil instaurou um procedimento na Corregedoria da instituição para apurar eventual envolvimento de um policial civil no vazamento de informações citado pela reportagem. O policial militar citado encontra-se regularmente afastado para exercer cargo em comissão junto ao STF.”
O QUE PODE ACONTECER
Só apuram a conduta do policial civil e/ou do assessor:
Atualmente, a Secretaria de Segurança Pública da Polícia de São Paulo instaurou procedimento na corregedoria para apurar vazamento de informações do policial civil não nomeado.
Se não identificarem crime na atuação do policial, apenas ilícito administrativo, ela pode apenas receber alguma sanção administrativa, que não chegaria a sanção penal (reclusão). Se for descoberto crime, a investigação fica a cargo de um promotor de justiça de 1º grau.
O advogado Ricardo Gloeckner, professor de direito criminal, diz que essa hipótese é pouco provável, pois não há, na sua visão, como desvincular o ministro do fato ocorrido pelos seus funcionários.
Como o ministro tem foro por prerrogativa de função, sua investigação ficaria obrigatoriamente sob supervisão da Procuradoria Geral da República, devendo ser julgada no STF.
Segundo o advogado, o Supremo anda revendo o posicionamento sobre os demais co-réus serem julgados em outras instâncias da justiça diferentes da do ministro. O encaminhamento do caso dos irmãos Brazão, segundo ele, seria o divisor de águas nessa regulação de competências.
Com informações de Poder 360