Você tem 27 superintendências; quero apenas a do Rio, disse Bolsonaro a Moro

05 de Maio 2020 - 15h24
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Em depoimento à Polícia Federal no último sábado (2), o ex-ministro da Justiça Sergio Moro afirmou que o presidente Jair Bolsonaro pediu a ele no começo de março deste ano a troca do chefe da Polícia Federal no Rio de Janeiro.

"Moro você tem 27 Superintendências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro”, disse Bolsonaro a Moro, por mensagem de WhatsApp, segundo transcrição do depoimento do ex-ministro à PF.

A íntegra do depoimento foi divulgada pela CNN Brasil. A Folha também teve acesso ao material.

Os investigadores perguntaram a Moro se ele identificava nos fatos apresentados em seu pronunciamento de saída do governo alguma prática de crime por parte de Bolsonaro. O ex-ministro disse que os fatos narrados por ele são verdadeiros, mas não afirmou se o presidente teria cometido algum crime.

“Quem falou em crime foi a Procuradoria-Geral da República na requisição de abertura de inquérito e agora entende que essa avaliação, quanto à prática de crime, cabe às instituições competentes”, disse Moro.

Segundo Moro disse em depoimento, o então diretor da PF, Maurício Valeixo, "declarou que estava cansado da pressão para a sua substituição e para a troca do SR/RJ". "Que por esse motivo e também para evitar conflito entre o presidente e o ministro o diretor Valeixo disse que concordaria em sair", afirmou o ex-ministro.

De acordo com Moro, em seguida o presidente Bolsonaro "passou a reclamar da indicação da Superintendente de Pernambuco". Segundo ele, "os motivos da reclamação devem ser indagados ao Presidente da República".

Segundo o ex-ministro, "o presidente lhe relatou verbalmente no Palácio do Planalto que precisava de pessoas de sua confiança, para que pudesse interagir, telefonar e obter relatórios de inteligência".

Moro afirmou que a pressão para substituir Valeixo “retornou com força em janeiro de 2020, quando o presidente disse que gostaria de nomear Alexandre Ramagem [diretor da Agência Brasileira de Inteligência] no cargo de Diretor Geral da Polícia Federal."

O ex-ministro disse que a cobrança foi feita verbalmente no Palácio do Planalto e “eventualmente” na presença do ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional). “Esse assunto era conhecido no Palácio do Planalto por várias pessoas”, disse Moro.

Moro afirmou ainda que "cogitou" aceitar as trocas na direção-geral da PF e na superintendência do Rio, mas que "depois, porém, entendeu que também não poderia aceitar a troca do SR/RJ sem causa". "Que a partir de então cresceram as insistências do PR (Bolsonaro) para a substituição tanto do Diretor Geral quanto do SR/RJ", declarou Moro.

“Como Ramagem tinha ligações próximas com a família do presidente isso afetaria a credibilidade da Polícia Federal e do próprio Governo, prejudicando até o presidente”, disse o ex-ministro.

“Essas ligações são notórias, iniciadas quando Ramagem trabalhou na organização da segurança pessoal do presidente durante a campanha eleitoral."

O ex-ministro disse que o presidente o cobrou em reunião do conselho de ministros, ocorrida em 22 de abril, a substituição da Superintendência do Rio e do diretor-geral da PF. Bolsonaro ainda teria voltado a pedir relatórios de inteligência e informação da Polícia Federal.

“O presidente lhe relatou verbalmente no Palácio do Planalto que precisava de pessoas de sua confiança, para que pudesse interagir, telefonar e obter relatórios de inteligência”, disse Moro no depoimento.

De acordo com Moro, o presidente afirmou que iria interferir em todos os ministérios, e quanto ao Ministério da Justiça, se não pudesse trocar o Superintendente do Rio de Janeiro, "trocaria o diretor geral e o próprio ministro da Justiça”, relatou o ex-juiz da Lava Jato.

Folha de S. Paulo