‘Salvação dos aposentados’: esquerda brigou para manter descontos que levaram a fraude no INSS

13 de Maio 2025 - 13h16
Créditos: Zeca Ribeiro

A instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar fraudes bilionárias no INSS reaqueceu o embate político em Brasília. Nas redes sociais, governistas e oposicionistas trocam acusações sobre a origem das brechas legais que permitiram os descontos indevidos nas aposentadorias, que hoje são alvo da operação Sem Desconto, da Polícia Federal.

O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), um dos principais críticos do governo, acusa a base de Lula de ter arquitetado o esquema que desviou recursos de aposentados. Já parlamentares governistas e auxiliares do presidente apontam que as falhas na regulamentação começaram na gestão Jair Bolsonaro.

Contudo, documentos da Câmara e do Senado revelam que foram justamente os partidos de esquerda, então na oposição, que atuaram ativamente para modificar a Medida Provisória 871/2019 — a primeira a tratar do tema — e afrouxar os mecanismos de controle criados pelo governo Bolsonaro.

O que previa a MP 871
A MP 871/19 foi enviada ao Congresso com a promessa de combater fraudes e melhorar os controles do INSS. Um dos pontos principais determinava que entidades associativas só poderiam descontar mensalidades diretamente da aposentadoria com autorização renovada anualmente pelos beneficiários. A medida também extinguia, a partir de 2020, a possibilidade de sindicatos atestarem a atividade rural para fins de aposentadoria.

O texto original citava a ocorrência de fraudes 16 vezes na justificativa enviada pelo Executivo.

A reação da oposição da época (hoje governo)
Durante a tramitação da MP, parlamentares da esquerda apresentaram dezenas de emendas para flexibilizar as exigências. Algumas propostas estendiam os prazos de revalidação até 2028 ou transformavam a exigência anual em quinquenal. Pelo menos 12 dessas emendas tinham trechos idênticos na justificativa, alegando que a renovação anual tornaria os descontos “praticamente inviáveis”.

O deputado Carlos Veras (PT-SP), irmão do presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), comemorou a aprovação das emendas:

“Fruto de vários dias de muito esforço, de muito trabalho, principalmente da CONTAG e de suas federações, do Partido dos Trabalhadores, dos partidos do campo, da Esquerda.”

A Contag, inclusive, foi a entidade que mais recebeu valores por meio dos descontos — R$ 426 milhões em 2023, segundo dados da Controladoria-Geral da União (CGU). A organização e seu presidente são alvos da investigação da PF.

Obstrução e discursos contrários à MP
A oposição, liderada por PT, PSB, PCdoB e PDT, chegou a obstruir votações para tentar impedir a aprovação da medida. O deputado Zeca Dirceu (PT-PR) afirmou à época que a MP “não vinha para combater fraudes”, mas para restringir direitos dos trabalhadores.
O senador Jaques Wagner (PT-BA) também criticou:

“Aniquilar a participação dos sindicatos é extremamente nocivo.”

Já o senador Paulo Paim (PT-RS) pediu que o plenário mantivesse a comprovação de atividade rural pelos sindicatos até 2028, alegando dificuldades para que trabalhadores rurais se adaptassem às novas exigências.

O que foi aprovado
O texto final da MP 871 incorporou várias dessas modificações. Embora a comprovação por sindicatos tenha sido oficialmente eliminada a partir de 2020, a regra não foi aplicada na prática — nem no governo Bolsonaro, nem no de Lula. O novo cadastro previsto para o INSS ainda não foi totalmente implementado, o que facilitou fraudes agora investigadas pela PF.

O que dizem os parlamentares
Procurado, o deputado Zeca Dirceu afirmou que mantém seu posicionamento. Segundo ele, a oposição se posicionou contra a MP porque ela “limitava a concessão de benefícios e aposentadorias”. Os senadores Jaques Wagner e Paulo Paim não se manifestaram.