
Escrevi (escreverei outros ainda) alguns textos ficcionais sobre o ambiente numa escola de uma cidade chamada Natividade de um estado chamado Rio das Mortes. São sofríveis (sou um terrível escriba), mas me divertem, porque utilizo nomes de personagens já criados por grandes mestres da literatura brasileira (Simão Bacamarte) ou de filmes clássicos (Zorba) ou de vultos da história (Amador, Ramsés, etc) ou de povos que tiveram impacto na história de outros povos (Sarraceno) e por aí vai, e o exercício me obriga a (re)ler clássicos da literatura e da história.
Quando comecei a escrevinhar sobre Natividade e Rio das Mortes, o Rio Grande do Norte foi sacudido por rebelião de presos na gestão do então governador Robinson Faria. E o das Mortes passou a ter um gostinho especial para mim, porque demonstrava que, às vezes, a vida e a ficção correm emparelhadas, mesmo que nós não queiramos, como explicita o atual ambiente no qual vários municípios do Rio Grande do Norte estão engolfados por fartura de violência sem precedentes em nossa história. Nunca o das Mortes fez tanto sentido.
Há mais de uma semana o Rio Grande do Norte é varrido por onda de ataques terroristas nos quatro cantos do estado e paralelamente aos eventos de banditismo, assistimos a incompetência da governadora do estado e de seus aliados, querendo esconder o que não é possível esconder, a saber, o ambiente de instabilidade social pelo qual passa o estado, associada à desfaçatez e à demagogia de políticos da oposição, “desejosos” de que tudo seja solucionado da noite para o dia. Acrescente-se ao caldinho as análises de estudiosos e intelectuais compadecidos da situação dos encarcerados, obrigados a dormir em celas sem ventiladores, a comer refeições estragadas, etc, etc e etc.
Há denúncias de que a revolta dos presos e de seus familiares (semana passada mulheres de detentos fizeram passeata do Midway, maior shopping center de Natal, até o Centro Administrativo, onde fica a sede da governadoria) está umbilicalmente ligada às más condições que eles enfrentam nos presídios, problema, ressalte-se, histórico e estrutural, logo responsabilidade da atual governadora e de todos os que a antecederam nas últimas três ou quatro décadas. Para ficar só neles, sem adentrarmos na responsabilidade de parlamentares, promotores e juízes.
Fiquemos em um dos itens, o da alimentação. Ora, se há comida estragada sendo entregue nos presídios, alguém está cegando (por incompetência ou por interesse pecuniário) para o problema. Caberia ao governo esclarecer e divulgar para a sociedade o que ocorre, se há incompetentes ou se há ratos. É até simples de resolver. A falha do governo em fiscalizar a qualidade da alimentação, porém, não permita que apenados se revoltem e mandem aterrorizar um estado inteiro. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.
É bom que fiquem claras algumas coisas. Parte dos problemas dos presos (comida ruim, falta de ventilação nas celas, superlotação, etc) é semelhante ao enfrentado por muitos pobres honestos e ordeiros que pagam impostos escorchantes e não recebem os serviços que o Estado deveria lhes oferecer, têm dificuldade para pôr comida em casa, moram na rua ou em casas em péssimo estado e em áreas de risco etc. E nem por isso as pessoas aqui fora – esquecidas por Estado paquidérmico, ineficiente e ineficaz, erguido para atender aos interesses mesquinhos de muita gente, inclusive de quem mora em condomínio de luxo e faz discurso de proletário – saem tocando fogo em ônibus, matando donos de estabelecimentos comerciais e aterrorizando a população.
O que os presos fazem é, em bom português, terrorismo, ao contrário do que tentou explicar delegada da polícia civil (http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/governo-evita-chamar-ataques-de-atos-terroristas/560072). A propósito, leiam o ótimo artigo do professor Luiz Roberto sobre o tema (https://historianosdetalhes.com.br/brasil/deixem-o-terror-para-la/)
Estamos em guerra e na guerra os soldados em combate vão para matar ou morrer.