
Fui por algumas vezes provocado por colegas e amigos a escrever sobre Jair Bolsonaro, quando ele exercia a Presidência da República, função que ele praticamente abandonou desde que perdeu, em segundo turno, a eleição para Lula.
Invariavelmente eu respondia que podiam ir aos meus escritos, disponíveis em endereços eletrônicas e iriam encontrar textos críticos sobre muita coisa e muita gente, inclusive sobre Bolsonaro, sobre Lula, sobre o PT, sobre Fernando Henrique Cardoso, sobre o PSDB, etc. Arrematava dizendo que não tinha o hábito de sentar e escrever, sistemática e semanalmente, a favor ou contra alguém.
Leio, com certo desalento, manifestações desses mesmos amigos e colegas sobre política, que de tão infantis causam-se certo constrangimento. Coisas como pobre de direita, servidor público que defende privatização e por aí vai. Menciono especificamente os dois dizeres porque são os que mais se repetem. Esclareço: as falas e textos dos meus colegas e amigos não me constrangem porque me confrontam, mas porque são pueris.
Para começar, não divido o mundo em esquerda e direita. Tal divisão, nascida durante a revolução francesa e utilizada organicamente durante o turbulento e curto século XX de Eric Hobsbawn, serviu à perfeição para a arquitetura teórica urdida por marxistas sentados sobre o mundo da luta de classes, que de classes nada tem, porquanto Karl Marx ter escrito mesmo sobre uma sociedade organizada em ordens e não em classes.
Servidor público é um indivíduo e como tal defende o que quiser, mesmo que as defesas dele entrem em choque com a corporação à qual ele pertence. Se vier a defender apenas os interesses corporativos do grupo ao qual pertence, ele perde a liberdade individual que pretende desfrutar para se aninhar nos moldes corporativistas. Eu poderia citar aqui exemplos em sequência de gente que defende os interesses pessoais e corporativistas como se fossem os interesses do povo, notadamente os mais humildes. Deixo isso para outro momento.
Os meus amigos e os meus colegas andam defendendo ardorosamente ou silenciando convenientemente sobre a PEC que o grupo eleito encaminha para aprovação no Congresso Nacional. O argumento básico é o de que ela garantirá, a curto e médio prazo, atendimento às demandas das camadas mais carentes da sociedade brasileira. Nobre, muito nobre, a pretensão de Lula e aliados. Mas por que não enviar também uma outra solicitando revisão na estrutura administrativa do Estado brasileiro, reduzindo excessos? Cito alguns exemplos: por que os poderes (Judiciário, Legislativo, Ministério Público) nadam em dinheiro enquanto falta o básico em escolas e postos de saúde? Por que instituições federais de ensino têm estrutura administrativa hipertrofiada, com setores com dois ou três servidores, praticamente sem trabalho, chefiados por um? Conheço caso de servidor que está sozinho num setor por ele chefiado. Por que no serviço público há sempre queixa de falta de recursos, no entanto nunca falta verba para uns piqueniques ou para polpudas bolsas que fazem a alegria da galera do andar de cima, com migalhas distribuídas para o andar de baixo?
Já li estudos e recomendações do Banco Mundial, de auditorias, de economistas consagrados sobre a necessidade de reforma do Estado brasileiro. De todos esses estudos e recomendações, pouco vi sobre os excessos do ministério público, do judiciário e do legislativo ou sobre as benesses de viagens, para nada, de chefões de repartições federais ou sobre polpudas bolsas pagas a funcionários que, somadas, ultrapassam o salário do pobrezito.
Qualquer reforma administrativa séria, e o Banco Mundial, o atual e o futuro governo federal sabem, tem de mexer nos tais poderes.
Recentemente li algo sobre a reabilitação da gratificação de quinquênio para os magistrados da justiça federal que entraram na carreira até 2006, medida aprovada pelo Conselho da Justiça Federal (CJF) e retroativa, por provocação da Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), a junho de 2006. Outras categorias vão mobilizar suas associações em busca do “direito”. Do direito de mamar nas suculentas tetas do Estado brasileiro (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/11/conselho-reativa-beneficio-salarial-retroativo-para-juizes-federais.shtml).
Que diz o atual governo sobre a farra? Nada. E o futuro governo? Nada. E meus colegas e amigos? Nada.
Estão todos defendendo os interesses dos pobres por meio do aumento indiscriminado do orçamento, criado por meio de endividamento a ser pago, em futuro não muito distante, por todos.