O patrimônio não

13 de Outubro 2021 - 07h18
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De todos os pensadores que já se ocuparam da política, o melhor para analisar a atualidade ainda é Nicolau Maquiavel, autor a quem, suspeito, Jair Bolsonaro nunca recorreu. Creio até que sequer folheou as obras dele e se as leu, não entendeu muita coisa, pois anda na contramão do que preconizou o pensador florentino, ao pôr os filhos acima dos interesses do Estado, ao falar o que pensa sem medir as consequências e a fazer pouco caso do patrimônio do cidadão brasileiro (https://www.terra.com.br/noticias/brasil/questionado-sobre-crise-hidrica-bolsonaro-diz-que-ligou-para-sao-pedro,e9ed21404524741e4d0f4ac14c2623a1baxv3j3d.html).

Para Nicolau Maquiavel, pai da moderna ciência política e autor d’O Príncipe, obra na qual aconselha os políticos a como governar e a como manter o poder, mesmo que para isso tenham que usar a força e a fazer muitos inimigos, a regra é clara e objetiva: um político no exercício do poder só deve falar com propósito objetivo, porquanto a atividade política ter como objetivo chegar a lugar específico e, assim, o que ele fala leva-o para perto ou deixa-o mais distante daquilo que pretende.

Por isso, ensinou Maquiavel, políticos não podem falar o que pensam; por isso, até mentem, se e quando necessário: “Nunca a um príncipe faltarão pretextos legítimos para mascarar a inobservância”, pois existe uma razão prática no poder, sendo necessário, às vezes, mentir para mantê-lo. Entretanto, não pode a mentira pela mentira. Ela é aceita, quando as circunstâncias exigirem, para salvaguardar os interesses do Estado; nunca deve ser dita apenas para dominar o poder.

O desgaste da imagem de Bolsonaro, tirando os erros de gestão, é fruto de suas próprias palavras. E o que ele diz contamina a agenda governista, mesmo que ela seja meritória.

Além desse problema, Bolsonaro enfrenta um outro, pior, que faz a sua reeleição subir no telhado. E não é Lula, como insistem em dizer os analistas políticos, mas a recessão (a economia tem mostrado sinais de recuperação mas bem abaixo das necessidades que garantam a queda brusca nas taxas de desemprego) (https://www.ipea.gov.br/cartadeconjuntura/index.php/tag/previsoes-macroeconomicas/), combinada com o aumento da inflação (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/10/aumento-da-vacinacao-ajudaria-a-reduzir-inflacao-pelo-mundo-aponta-fmi.shtml), fenômenos que ameaçam a renda do brasileiro. Outra vez, Maquiavel vem a calhar: “É muito mais fácil para um homem esquecer a morte do pai a esquecer a perda do patrimônio”.

Mesmo dirigindo um governo mambembe e capenga, o presidente Jair Bolsonaro ostenta, segundo os mais variados institutos de pesquisa, índices que variam de 20% a 30% de intenções de votos. Como ponto de partida para uma campanha presidencial como a que se avizinha não é pouca coisa, ainda mais para alguém que tem a caneta para nomear, garantir gastos, etc.

Porém, o atual presidente e candidato a renovar o mandato está enredado no mau desempenho da economia e se até o início do próximo ano não houver uma reviravolta nos rumos econômicos do país, o seu projeto eleitoral corre sérios riscos.

Em 1992, James Carville, marqueteiro da campanha Bill Clinton, candidato democrata à presidência dos Estados Unidos, identificou o desempenho claudicante da economia norte-americana como calcanhar de Aquiles da gestão do então presidente e candidato à reeleição George Bush. Centrou fogo ali, forjando a frase: “É a economia, estúpido!”.

A vida econômica das pessoas falou mais alto e Clinton venceu.

As eleições presidenciais de 2022, no Brasil, parecem seguir caminho parecido. E a Bolsonaro tem faltado um Carville. Não é só isso, mas é principalmente isso.