Indicado ao BNDES, Mercadante elogiou Plano Cruzado em 1986 e criticou Real em 1994

17 de Dezembro 2022 - 13h51
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Aloizio Mercadante fiscaliza cumprimento de medidas de congelamento do preço em supermercado, em 1986. “Aparentemente, no Brasil do Cruzado, a inflação acabou”, disse Poder360 17.dez.2022 (sábado) - 5h45

Indicado para a presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) no próximo governo, o ex-ministro Aloizio Mercadante, 68 anos, tem longa trajetória de orientação econômica e política ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Embora seja tido como um economista moderado frente às correntistas petistas menos ortodoxas, Mercadante colecionou declarações incisivas de fatos da vida econômica brasileira nas últimas 3 décadas. As avaliações incluem elogios ao tabelamento de preços no governo Sarney, em 1986, e críticas à adoção do Plano Real, em 1994, que estabilizou a economia e deu uma moeda estável ao Brasil. 

Em vídeo antigo que circula nas redes sociais, o ex-ministro aparece em um supermercado, com os cabelos ainda pretos e o bigode característico, em reportagem gravada para a Rede TVT, em 1986. Faz uma análise elogiosa do “Plano Cruzado” de José Sarney –que tabelou preços de alimentos e mercadorias para conter a inflação de múltiplos dígitos. 

Mercadante caminha pelas prateleiras e fiscaliza o cumprimento dos congelamentos com uma lista da extinta Sunab (Superintendência Nacional do Abastecimento).

“Quando você vinha para o supermercado para fazer suas compras, a cada dia, a cada semana, todos os meses, os preços iam aumentando. Você ia comprar um pacote de maizena, um mês depois era 15% a mais. Agora não”, narrou à época. “Aparentemente, no Brasil do Cruzado, a inflação acabou”, dizia o jovem Mercadante, em tom de elogio ao plano que depois alguns meses fracassou.

Em seguida, Mercadante descreve a falta de estoque de algumas mercadorias que, segundo ele, seria fruto de um boicote dos produtores para pressionar o governo a desindexar os preços.

“Vários produtos não estão chegando na casa da dona de casa. E, principalmente, os remédios estão faltando. Por que isso está acontecendo? Porque as grandes empresas, os grandes empresários, diante do congelamento dos preços, estão deixando de produzir os produtos, não estão entregando para os fornecedores para pressionar que os preços voltem a subir”, afirma mercadante no vídeo.

Em 1994, então com 39 anos, Mercadante foi escalado para compor o núcleo duro da coordenação de campanha de Lula em sua 2ª tentativa de chegar ao Palácio do Planalto. Era forte candidato a ser ministro da Fazenda em caso de vitória. Com as acusações de desvio de verba contra o candidato a vice José Paulo Bisol, assumiu a vaga na chapa petista, em junho.

No acervo de publicações do jornal Folha de S.Paulo, é possível recuperar declarações feitas por Mercadante na construção da plataforma de campanha lulista à época.

Em fevereiro de 1994, ele deu aval para a versão final do programa de governo do PT sem delinear a política do partido para o pagamento da dívida externa brasileira. O “cheque em branco” daria margem para uma possível moratória caso Lula chegasse à Presidência, avaliavam especialistas de mercado.  

Em uma das reportagens, Mercadante foi descrito como uma espécie de “Posto Ipiranga” lulista, embora naquela época não existisse a expressão. “Nos encontros com empresários, é a ele que Lula pede socorro na hora de tratar de números e teoria”, publicou o jornal. 

O petista tinha boa popularidade e liderava a corrida presidencial com ampla margem e chance real de vitória no 1º turno. Em pesquisa Datafolha de 10 de abril de 1994, Lula aparecia, no melhor cenário, com 37% das intenções de voto. A vantagem chegou a 42% em 6 de maio, ante 15% de Fernando Henrique Cardoso, faltando 5 meses para a eleição.

Então ministro da Fazenda de Itamar Franco, FHC foi alvo de críticas de Mercadante pelo plano de renegociação da dívida externa concluído em abril daquele ano. “Foi um péssimo acordo”, disse, avaliando que o cancelamento de parte da dívida brasileira teria sido aquém do feito em outros compromissos similares, como na Polônia e na República Dominicana.

Em entrevista ao jornal em maio, ele voltou a criticar o acordo e disse que as exigências dos credores foram “completamente inapropriadas”. 

“O fato de o plano econômico não estar pronto e o Fundo Monetário Internacional ter recusado a liberação dos recursos só justifica que o acordo foi precipitado. Por que não se poderia esperar mais 2 meses em uma negociação de 11 anos?”, questionou. 

No mesmo mês, em viagem a Nova York, Lula deixou investidores e banqueiros preocupados com a fonte da arrecadação em um eventual governo. As dúvidas pairaram sobre o risco de um calote. O petista era assessorado por Mercadante.

O coordenador da campanha também destacou ser contra a dolarização da economia, que definiu como um “caos”, embora evitasse apresentar o desenho de uma contraproposta petista. “Dolarização é o tipo de coisa que é fácil para entrar, mas muito difícil pra sair”, avaliou.