Com cabeça de 2003, Lula toma choque de realidade nos primeiros 100 dias

09 de Abril 2023 - 07h41
Créditos:

Os primeiros cem dias do governo Lula (PT), a se completarem amanhã (10), foram um pouco mais difíceis do que o presidente esperava. Os principais anúncios na data vão ser relançamentos de programas antigos, numa versão repaginada dos primeiros mandatos, e a prova de fogo com o Congresso ainda nem aconteceu, mas promete.

Como foram os 100 dias?

Lula retomou programas-chave da sua gestão anterior (2003-2010), com foco no social. Parte havia sido extinta ou paralisada por Jair Bolsonaro (PL). O petista trouxe de volta o Minha Casa, Minha Vida, o Luz para Todos e o Mais Médicos, entre outros.

Algumas iniciativas, como o Bolsa Família, já estão em atividade. Outros foram anunciados, mas não iniciados, como o novo PAC (Programa de Aceleração de Crescimento), que deverá sair no final de abril.

A semelhança com 2003 —algo lembrado por Lula com certa frequência— também tem criado obstáculos. O presidente encontra uma sociedade mais dividida eleitoralmente, uma polarização política bastante forte e um Congresso mais conservador. Nas negociações, por vezes, teve de ceder mais do que pretendia.

Também enfrenta um cenário econômico ruim deixado por Bolsonaro. Com a taxa básica de juros em 13,75% e o desemprego em quase 8%, a recuperação da economia vai ser mais demorada do que o governo gostaria, enquanto tenta equilibrar promessas de campanha com medidas não tão populares, como o novo arcabouço fiscal para regular as contas públicas.

A minha obsessão nos primeiros 100 dias era retomar as políticas sociais que deram certo. Agora, a obsessão é fazer a economia voltar a crescer, voltar a funcionar."
Lula, a jornalistas, na quinta passada

Quais programas voltaram

Os primeiros cem dias de governo foram marcados por entregas e anúncios quase semanais de programas sociais. Com foco "no dia a dia do povo brasileiro", como Lula gosta de dizer, grande parte vem de gestões anteriores. São eles:

  • Minha Casa, Minha Vida: Programa de moradia popular relançado em fevereiro já entregou 5.000 casas por todo o país. O plano é de 2 milhões até 2026. Tinha obras paralisadas desde 2015.
  • Bolsa Família: Retomado em março, o programa de assistência social fixou o valor de R$ 600 por família, com mais R$ 150 para cada filho menor de sete anos de idade, e retomou exigências abandonadas pelo Auxílio Brasil de Bolsonaro, como vacinação e frequência escolar. Também foi feito um pente-fino para apurar irregularidades nos cadastros.
  • Mais Médicos para o Brasil: Com nome semelhante ao anterior, o programa começou a enviar de profissionais de saúde a cidades do interior em março. São 15 mil vagas, com foco em profissionais brasileiros, em 2023. A dificuldade de reter os profissionais em locais mais vulneráveis se mantém.
  • PAC: Ainda sem nome, o novo Programa de Aceleração do Crescimento, marca da gestão Dilma Rousseff (PT), será relançado no final de abril, com frentes voltadas não só à infraestrutura, mas também em desenvolvimento urbano, educação e saúde.
  • Luz para Todos: O programa que leva energia elétrica a lugares sem acesso será incluído no novo PAC.

Não é mais 2003

O presidente anda ansioso. Segundo pessoas próximas, há pressa e pressão sobre ministros para a entrega de resultados. Amanhã, na reunião dos cem dias cada ministério deve comentar seus feitos desde janeiro e o que vem por aí. Lula sabe que sua gestão enfrenta uma lua de mel difícil, com o mercado, com a sociedade ou com os outros Poderes.

Quando eu disse que a gente ia começar a ter o espetáculo de crescimento neste país, não foram poucos os jornalistas que zoaram com minha frase, dita numa reunião na Ford em 2004. Acontece que naquele ano a economia cresceu 5,8%, ali estava começando o jeito positivo de a economia brasileira voltar a funcionar. Estou convencido de que ela vai voltar a funcionar, na medida que a gente volta a colocar o pobre no orçamento."
Lula, na semana passada

O petista tem feito gestos políticos pela governabilidade, que visam, em especial, manter a frente ampla lançada na campanha e garantir a aprovação de projetos importantes no Congresso, onde seu partido não tem maioria. Para isso:

Incluiu a oposição no governo. De cara, cedeu três ministérios para ficarem sob a gerência do União Brasil, em acordo costurado com o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Puxou o centrão para perto no Congresso. Lula também se aproximou de Lira, grande apoiador de Bolsonaro durante os últimos quatro anos, a quem o próprio petista criticava e chamava de "imperador do Japão". Com a aliança, que incluiu apoio à reeleição do progressista em fevereiro, o governo conseguiu aprovar a PEC da Transição em dezembro, antes de assumir, e tem apoio para o arcabouço fiscal e para a reforma tributária.

Fonte: Uol