
As redes sociais têm sido, neste início de século XXI, a Ágora, espaço no qual as pessoas se confrontam para emitir opiniões sobre os mais variados assuntos, inclusive sobre política.
Exatamente por isso os dois principais contendores, Bolsonaro e Lula, e seus militantes empunham armas nesse espaço. Ter audiência ali é identificado como sinal de força política.
Após a participação de Bolsonaro no Podcast Flow, os bolsonaristas passaram a divulgar que o sucesso político do seu líder poderia ser conferido pelo número de likes e views em redes, como se o sucesso de uma loja pudesse ser avaliado pela quantidade de pessoas que olham a vitrine e não pelo seu fluxo de caixa.
Bolsonaro e Lula cansaram de cometer erros graves ao longo de suas trajetórias.
Lula e seu partido se recusaram a assinar a Constituição. É certo que a nossa Carta é um emaranhado de ideias que, juntas, conferem ao texto uma conjunção de utopias, algumas irrealizáveis, mas não foi por isso que Lula e o PT a ela se opuseram. Tampouco, depois de feita, cidadão algum poderia, como bem disse Ulisses Guimarães, presidente da assembleia constituinte, desrespeitá-la. O mesmo Lula e o mesmo PT fizeram cerrada oposição do Plano Real, responsável por racionalizar a vida econômica da nação. E seguiram sendo contra outros marcos civilizatórios.
Bolsonaro, por seu turno, foi contra o Plano Real, as privatizações, o Bolsa Família, a reforma da previdência e, agora, contra a reforma tributária.
A reforma tributária foi retalhada (e será ainda mais no Senado e depois por meio da legislação complementar), mas é melhor ter uma reforma Frankenstein que nenhuma. Foi assim com as reformas trabalhista e previdenciária. Deveríamos estar acostumados com o Brasil, que caminha como um zumbi, assombrando a todos.
A postura de Bolsonaro evidencia a sua “gigantesca capacidade” de liderar a oposição contra a reforma tributária. Pediu resistência contra o PT e o comunismo, como se a proposta fosse petista e comunista. Ao final, a PEC foi aprovada no primeiro turno, na Câmara de Deputados, por 382 a 118, e no segundo por 375 a 113 (por ser emenda constitucional precisaria de 308 votos). Os deputados do PL, partido ao qual Bolsonaro é filiado, deu 20 votos a favor.
A votação da semana passada, ao contrário do que sugerem as manchetes de praticamente todos os noticiosos, não foi uma disputa entre Lula (no geral bem desinteressado do assunto; geralmente líderes populistas pouco se interessam por assuntos e temas administrativos complexos e cheio de detalhes) e Bolsonaro (oposicionista irresponsável e descolado da realidade). Uma reforma tributária era ansiada pela nação e precisava ser aprovada – e dormitava no Congresso Nacional há três décadas. E não foi aprovada apenas com os votos do PT e de sua base fiel, hoje restrita a algo em torno de 140 votos.
Tem ministro surfando nessa aprovação, como se tivesse realizado um bom trabalho. É preciso reconhecer que o texto aprovado apresenta muitos jabutis, que devem e certamente serão eliminados ou minorados nas próximas votações. Sem dúvida, porém, era necessária a aprovação da reforma.
Analisando superficialmente o texto final é possível indicar que os parlamentares e a sociedade precisam de muito mais tempo para avaliar os reais impactos da reforma. Um dado, para mim, é delicado: como está, o Executivo poderá aumentar as alíquotas dos impostos, sem aval do Legislativo (quem duvida consulte a parte referente aos impostos da União). Como desconfio do Estado e, por tabela, do governo, de qualquer governo, olho receoso para o item que destaquei, porque pode ser a porta de entrada por meio da qual o nosso sangue será desviado para fins pouco nobres.
Repito: a reforma tributária final ainda merece e terá muita discussão, o que ocorrerá, imagino, no Senado.
Que assim seja.