A corrupção e o moralismo político

08 de Novembro 2020 - 20h01
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Quando a Assembleia Constituinte se reuniu, pela primeira vez, em 1987, veio à tona novamente, como não poderia deixar de ser, o papel a ser desempenhado pelo Estado e pelo mercado na construção econômica de um Brasil democrático.

Mais Estado, mais corrupção; menos Estado, menos corrupção. Esta é a equação básica dos que defendem menos ou mais Estado.

Não é difícil supor que a corrupção política aumenta quando determinados personagens ocupam postos de mando na administração pública sem que estejam sujeitas ao mandato democrático ou ao controle burocrático.

São indivíduos que estão em cargos importantes por indicação partidária.

Todos invariavelmente têm ligações muito próximas com políticos e administradores e são extremamente leais aos seus padrinhos. Os casos de corrupção durante a nova república demonstram isso.   

Seria o caso de dizer que o problema está encastelado somente no Estado?

Sim e não, explico.

A composição nefasta com o Estado é da essência de parcela grande e fundamental do empresariado nacional.

Não são poucos os empresários brasileiros que interagem com políticos e cujo sucesso profissional é baseado menos na competência de suas empresas e mais no acesso que têm à máquina pública.

O sucesso econômico deles é oriundo menos da competência e engenhosidade e mais dos, digamos, contatos políticos que mantêm.

Há propostas milagrosas para acabar com a praga da corrupção.

Algumas construídas ou incentivadas por quem alimenta o monstro.

Lembro-me de um estudo que li há certo tempo sobre o aumento dos casos de corrupção em vários países, entre eles o Brasil.

O texto alertava para o fato de que a política piora de qualidade quando novas classes sociais entram no jogo político.

Isso não quer dizer que houvesse menos corrupção quando havia poucos grupos sociais monopolizando ou se revezando nos postos de mando.

O que havia era que a corrupção se limitava a esses poucos grupos, entre “membros do mesmo grupo social e, portanto, ninguém promovia escândalos, preservando a face externa da classe”, como já disse um estudioso do fenômeno.

Por isso são tão poucas as denúncias, se comparadas com o momento atual, de casos de corrupção durante o período oligárquico da república velha ou mesmo do império.

Nem cito os regimes autoritários de 1937-45 (estado novo) ou de 1964-85 (regime militar), porque em ambos a liberdade de expressão era cerceada.

A partir de 1930, com o ingresso de novos grupos para disputar os recursos do Estado, as denúncias de corrupção dão o ar da graça, pois aristocratas oligarquizados não estavam dispostos a repartir o butim estatal com comerciantes e industriais.

E quando estes já estão admitidos no campo que pode repartir o sagrado pão da corrupção, vem a turma do chão da fábrica.

Aí, foi demais!

Daí em diante, o discurso da ética ganhou as ruas e as redações, não necessariamente nessa ordem, massificando-se.

Não porque os conflitos fossem inteiramente novos. Tampouco porque os recursos estivessem sendo usados de forma escusa.

A briga nasceu porque interesses escondidos no seio da corrupção estavam sendo contrariados. O bolo é pequeno, julgam, para ser dividido com tantos.

O que há é a instauração de um novo conflito distributivo. E com ele nasce, entre muitos dos que assaltaram o dinheiro da “viúva”, o discurso da ética política.

É assim que caminha a história do Brasil – pouco dinheiro, muita bazófia e vontade quase nenhuma de acertar o passo entre o Estado e a sociedade que o financia.