A arte de empurrar com a barriga

15 de Março 2021 - 18h56
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Quando ingressei na universidade, em meados da década de 1980, a inflação anual brasileira era de três dígitos anuais e logo evoluiu para quatro dígitos, na segunda metade da mesma década. Planos econômicos eram tirados da cartola, um atrás do outro. Todos sem atacar a fonte do problema, a saber, o excesso de gastos públicos.

Existe forte correlação entre a oferta de moeda e o nível de atividade econômica.

De 1986, com José Sarney, a 1991, com Fernando Collor de Melo, o Brasil foi alvo das mais inusitadas experiências econômicas heterodoxas, todas atacando os efeitos da inflação, sem olhar para a causa. Congelamento de preços e salários eram o caminho mais fácil para causar ainda mais desarranjo a uma economia acostumada a lidar com o dragão inflacionário, até que veio, em 1994, o Plano Real e pôs o dedo na ferida, mostrando que o desastre econômico brasileiro era o excesso de gastos públicos.

A solução do governo para garantir a desordem de suas contas e assim bancar os seus excessos era o imposto inflacionário (https://epge.fgv.br/users/rubens/wp-content/uploads/2015/05/Imposto_Inflacionario_Cysne-Coimbra-Caetano1.pdf)

Controlar preços, mesmo de forma legal ou voluntária, provoca a destruição do sistema de economia livre e sua substituição por um sistema de controle central e não é efetivo na prevenção da inflação, pois o que é determinante no nível médio de preços e salários é o volume de moeda existente na economia, e não a forme de empresários por lucros e de trabalhadores por salários.

Soluções fáceis para problemas complexos não existem. Para superar definitivamente a inflação, é necessário que o governo brasileiro arrume a casa, pondo as suas contas em ordem. E para isso só existem dois caminhos para o governo: cortar forte e drasticamente os gastos ou aumentar forte e drasticamente a receita. Se houver outro caminho, que o mago da economia se apresenta e aponte-o.

Os governos brasileiros têm de dedicado a caminhos danosos: aumento da dívida e impressão de moeda. Os dois primeiros levam à inflação, respectivamente, a médio/longo e curto prazo.

Às vezes, o governo combina os dois com aumento da carga tributária. E aí temos o pior dos mundos possíveis: inflação e recessão ou crescimento econômico mirrado.

O fantasma da inflação ronda o Brasil porque o governo não faz o que deve fazer – diminuir os gastos públicos, cortando na carne. E como não toma o caminho da virtude e não tem mais crédito para tomar emprestado o necessário para cobrir o déficit, o déficit fiscal brasileiro é empurrado para a frente. Medidas paliativas como mexer no câmbio não resolvem o problema.

Nos anos 1980-90, a aceleração da inflação, que resultou na hiperinflação, gerava reforço de caixa para o governo, pois elevava a arrecadação de impostos antes de o governo cumprir com os seus compromissos financeiros.

Quando acabou o Plano Real drenou o pântano e a inflação caiu para índices civilizados, o governo federal percebeu que, sem o imposto inflacionário, não contava com caixa para fazer frente aos gastos. Apesar da adoção de medidas saneadoras na esteira do Plano Real, os governos (federal, estaduais e municipais) trataram de aumentar a carga tributária, que praticamente dobrou nas últimas duas décadas e meia e, ainda assim, não tem sido suficiente para cobrir os gastos públicos. E desta forma, os governos foram se endividando cada vez mais, a dívida pública crescendo exponencialmente e as contas se avolumando ano-a-ano.

Este(s) ou o(s) próximo(s) governo(s) terá(ão) um trabalho hercúleo pela frente: fazer o governo caber dentro do orçamento.

É isso ou os brasileiros continuarão sendo tungados pelo Estado