
Semana passada escrevi o primeiro dos três textos sobre o conflito entre israelenses e palestinos, quando um atentado terrorista do Hamas foi desfechado contra Israel, resultando na reação militar israelense, no aumento da tensão no Levante (Oriente Médio) e nas renhidas disputas de informações e narrativas que mobilizam defensores de israelenses e de palestinos nas mais diversas mídias (https://www.grandeponto.com.br/blog/post/israel-versus-palestina-a-realidade-por-tras-do-conflito-1).
Israel é uma democracia parlamentarista com sistema pluripartidário. O seu parlamento, Knesset, tem cento e vinte membros eleitos para mandato de quatro anos e no qual os dois maiores partidos representados são o Likud (partido da direita nacionalista) e o Yesh Atid (partido centro-liberal), com 32 e 24 membros respectivamente. Este, representante da classe média secular israelense, é defensor da retomada das negociações de paz com os palestinos e apoia a solução que advoga a existência de dois Estados; aquele, liberal na economia e conservador nos costumes, é muito cético acerca da possibilidade de paz com os palestinos.
O partido que tem a maioria dos assentos no Parlamento (atualmente o Likud) escolhe o Primeiro-Ministro.
Como líder do Likud, Benjamin Netanyahu é o atual Primeiro-Ministro de Israel e, desde a semana que Israel foi alvo do ataque do Hamas, está à frente de um governo de coalizão, ao lado de um de seus principais adversários políticos, Benny Gantz, líder de uma coligação de partidos liberais.
A Palestina, dividida em dois territórios, a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, tem uma espécie de governo duplo, com o Hamas à frente da Faixa de Gaza e a Autoridade Palestina governando a Cisjordânia.
No Democracy Index 2022 (https://www.eiu.com/n/campaigns/democracy-index-2022/) elaborado pela Economist Intelligence Unit, Israel é considerado uma democracia e ocupa a 29ª posição entre os países avaliados, superando a capenga democracia brasileira e mesmo democracias consolidadas como a Bélgica, enquanto no Varieties of Democracy (V-Dem) (https://v-dem.net/data/the-v-dem-dataset/), da Universidade de Gotemburgo (Suécia), está como uma democracia liberal, ocupando a 39ª posição, superando uma vez mais o Brasil.
Segundo os registros do V-Dem, no norte da África e no Oriente Média há 98% de regimes autocráticos (monarquias tribais e arremedos de repúblicas). Em nenhuma outra região do mundo há algo da mesma envergadura. A Palestina, dividida em duas partes, ocupa a 135ª posição com a Cisjordânia e a 156ª com a Faixa de Gaza; a população dos dois territórios desfrutam de menos liberdade (veremos isso no terceiro texto, próxima semana) do que o Haiti e o Iraque, para ficar em um país-problema das Américas e uma reconhecida ditadura do Levante (Oriente Médio).
Israel é, por qualquer critério utilizado nos dois documentos acima indicados, uma democracia. A única da região. No entanto, o regime democrático passou, pincipalmente nas administrações de Benjamin Netanyahu (esteve como Primeiro-Ministro em dezenove dos últimos vinte e sete anos) por apertos, notadamente durante a atual gestão, acusada de tentar destruir algumas bases da democracia israelense, quando aprovou proposta de reforma judicial que restringe as atribuições do poder judiciário. Segundo a propositura do governo, o Supremo Tribunal fica impedido de agir para bloquear medidas que os juízes considerem “extremamente irracionais” (https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/israel-entenda-o-polemico-projeto-de-lei-que-limita-poderes-da-suprema-corte/).
A medida fere de morte a democracia em Israel porque os tribunais são praticamente a única frente para restringir o poder do governo, tendo em vista o país ser unicameral (só tem uma câmara legislativa) e não ter uma Constituição. Com a nova legislação, um Primeiro-Ministro com grande base de apoio no Knesset (Parlamento) não terá contrapeso legal (https://g1.globo.com/mundo/noticia/2023/03/28/por-que-israel-nao-tem-constituicao-e-como-funciona-judiciario-no-pais.ghtml).
A atuação do governo liderado por Benjamin Netanyahu levou a população às ruas para protestar e resultou em aproximadamente setecentas detenções. O ataque do Hamas, porém, fez a política se mexer e garantir ao Primeiro-Ministro a montagem de um governo que congrega as principais forças políticas do país.
Por ora, Netanyahu segue firme no cargo, mas a firmeza dura enquanto ele oferecer respostas firmes à ameaça terrorista representada pelo Hamas e seus aliados. Passada a tormenta, ele provavelmente será um Primeiro-Ministro demissionário.