Bastidores de Escola

23 de Agosto 2023 - 10h45
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Em setembro de 2019, o Ministro da Educação do governo Jair Bolsonaro, Abraham Weintraub, disse, como se estivesse revelando um absurdo, que professor universitário ganha até R$ 20 mil por mês.

A manifestação do então Ministro da Educação surgiu quando avaliava a possibilidade de cobrança de mensalidade dos estudantes das universidades públicas. Para ele, seria uma vitória de Pirro, pois isso não resolveria o problema de orçamento da pasta, tendo em vista a “zebra mais gorda que é o professor que tem dedicação exclusiva ter apenas 8 horas de aulas semanais e ganhar de R$ 15 a R$ 20 mil por mês (...) e isso cresce 8% ao ano acima da inflação. São 300 mil professores. Faz essa conta” (https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2019/09/27/interna-brasil,791121/ministro-ataca-salario-de-professores-federais.shtml.

O ex-ministro falava muito sobre a pasta que deveria dirigir e sobre a qual pouco conhecia. Os salários apontados por Weintraub são a remuneração justa daqueles que desempenham cotidiana e corretamente, sem acréscimo algum (de comissões, representações ou bolsas), as funções para as quais foram aprovados em concursos públicos. Os barões da docência têm outros dutos que irrigam suas contas bancárias. Então fiquemos, de forma panorâmica, no exemplo dos salários por ele citado:

  1. Para chegar ao salário apontado de R$ 15 a 20 mil por mês, o professor chegou ao fim da carreira, geralmente atingida após quinze anos de serviços prestados e sendo doutor. Salário igual a um funcionário de nível superior de um tribunal ou da polícia rodoviário federal ou um agente da polícia federal e muito abaixo do um auditor da receita federal. Nem falemos de procuradores ou juízes federais. E o professor terá de ministrar pelo menos 8 horas de aulas semanais (14 horas semanais em outras instituições federais de ensino), sem contar outras atividades relacionadas à função docente e não necessariamente desenvolvidas em sala de aula.
  2. Enquanto alguns professores desempenham corretamente suas funções docentes de pelo menos 8 horas semanais (14 horas semanais em outras instituições federais de ensino), o correspondente a duas ou três tumas, há os que conseguem ludibriar os marcos normativos, juntando turmas e utilizando outros artifícios, para diminuir a carga horária e registrar a carga horária cheia. Ou os que estão há décadas em cargos de gestão muito bem remunerados, com polpudas gratificações ou em assessorias porque não têm perfil algum para o exercício da docência ou simplesmente porque se recusam a lecionar.
  3. Lembrando: o tempo mínimo de carga horária docente é de 8 horas semanais, no entanto muitos professores tratam o piso como teto – e sob o olhar complacente de gestores.
  4. Professores conseguem dobrar e até triplicar os salários participando de projetos financiados pelo Estado (alguns poucos conseguem captar recursos privados). Aqueles que participam de projetos ricamente financiados não deveriam ter tempo de carga horária reduzido abaixo do mínimo regulamentado, mas têm ou se utilizam dos mais diversos artifícios para garantir o mínimo de carga horária.
  5. Se os marcos normativos fossem respeitados e o piso da carga horária (8 ou 14 horas semanais) fosse tratado como piso e não como teto, o número de vagas ofertado seria maior ou as instituições não precisariam abrir concursos públicos em série para contratação de docentes.

Os salários pretensamente astronômicos dos professores são apenas a ponta de um iceberg e enquanto forem utilizados de forma demagógica por Presidentes da República e por Ministros que desconhecem minimamente como funciona a máquina no Ministério da Educação (inclusive as universidades federais e os institutos federais), os verdadeiros ralos seguirão engolindo os impostos e o papel moeda emitido pelo Estado.